Alexandre
Fortes
Professor
de História Contemporânea e Diretor do Instituto Multidisciplinar da UFRRJ
Aluno
do Pedrinho em 1980
Outubro
de 1980. O país respirava as esperanças da redemocratização. O polo industrial e
as instituições de ensino superior de São Leopoldo, como a Unisinos e a Escola
Superior de Teologia, atraíam gente das mais variadas partes do Rio Grande do
Sul, de outros estados e dos países vizinhos. A vida política e cultural da
cidade era intensa.
Minha
turma da primeira série do segundo grau no Pedrinho me elegera “monitor”. Talvez
por ser um bom aluno, quiçá por algumas das minhas atitudes expressarem a
“rebeldia” dos adolescentes de então.
O
uniforme nos incomodava profundamente. Eu usava calças de tergal cinza largas o
suficiente para poder vestir um jeans sob elas. Com uma camiseta sob a camisa
branca, aproveitava a primeira troca de professores para ir ao banheiro e mudar
de roupa. Jeans e camiseta combinavam melhor com meus cabelos à la Robert Plant.
No
começo do segundo semestre, houve uma reunião no Serviço de Orientação
Educacional. Fizemos reivindicações e críticas à gestão da escola. A diretora Noemi,
dizia-se, viera transferida da fronteira junto com o marido coronel, que
assumira o comando de um quartel em São Leopoldo.
Pouco
depois, fui procurado por alunos que organizavam uma chapa de oposição para o
Grêmio Estudantil Tiradentes. Nosso candidato a presidente foi o Jairo
Pafiadache de Quadros, e eu era seu vice. Anette Morelle, prima do Jairo,
também estava na chapa.
Eles
eram de uma família politizada de Quaraí, e participavam da construção da
Juventude Socialista do PDT, dirigida por ex-militantes da VAR-Palmares. Nossos
“assessores” – Manolo, irmão do Jairo, e Élgaro, irmão da Anette – falavam com
admiração de Calino e Carlos Araújo (não me lembro de mencionarem Dilma,
integrante do mesmo grupo).
Ganhamos
as eleições facilmente, com uma campanha criativa. Henrique, meu amigo cabeludo,
preencheu o nome da chapa (“Unificação”) com desenhos psicodélicos numa matriz
de mimeógrafo a álcool (a técnica de propaganda de massas ao nosso alcance). Saltando
o murinho do Fórum saíamos do colégio para ir a reuniões secretas, e por ali entrou
o equipamento de som da banda Phoenix com o qual fizemos um “comício relâmpago”
na hora do recreio.
Após
quinze dias nossa gestão foi interrompida bruscamente pela Polícia do Exército,
que apreendeu nossos documentos, cartazes e discos (de Geraldo Vandré a
rock’n’roll) e lacrou a sede do grêmio.
Apesar
da abertura, o medo permanecia onipresente. O professor Baldissera, numa
reunião sigilosa, me explicou que os docentes solidários conosco temiam
represálias. Meus pais foram ameaçados com a Lei de Segurança Nacional por
causa de um texto “subversivo” de minha autoria. Dois colegas foram expulsos.
Eu já tinha passado por média, mas ao tentar me matricular, no ano seguinte,
descobri que não havia vagas para mim, decisão ratificada pelo delegado
Regional de Ensino. O sistema público fechava suas portas a um aluno de
desempenho exemplar, numa idade em que a Constituição o obrigava a permanecer
estudando.
No
Colégio São Luís, fui recebido de braços abertos pelo padre Roberto, amigo de
Dom Pedro Casaldáliga. Acabei me tornando presidente do Grêmio Estudantil Edson
Luís.
A
primavera no Pedrinho foi curta, mas marcou minha vida para sempre.