sábado, 28 de dezembro de 2013

O movimento secundarista do Pedrinho no começo dos anos 1980

Alexandre Fortes

Professor de História Contemporânea e Diretor do Instituto Multidisciplinar da UFRRJ
Aluno do Pedrinho em 1980

Outubro de 1980. O país respirava as esperanças da redemocratização. O polo industrial e as instituições de ensino superior de São Leopoldo, como a Unisinos e a Escola Superior de Teologia, atraíam gente das mais variadas partes do Rio Grande do Sul, de outros estados e dos países vizinhos. A vida política e cultural da cidade era intensa.
Minha turma da primeira série do segundo grau no Pedrinho me elegera “monitor”. Talvez por ser um bom aluno, quiçá por algumas das minhas atitudes expressarem a “rebeldia” dos adolescentes de então.
O uniforme nos incomodava profundamente. Eu usava calças de tergal cinza largas o suficiente para poder vestir um jeans sob elas. Com uma camiseta sob a camisa branca, aproveitava a primeira troca de professores para ir ao banheiro e mudar de roupa. Jeans e camiseta combinavam melhor com meus cabelos à la Robert Plant.
No começo do segundo semestre, houve uma reunião no Serviço de Orientação Educacional. Fizemos reivindicações e críticas à gestão da escola. A diretora Noemi, dizia-se, viera transferida da fronteira junto com o marido coronel, que assumira o comando de um quartel em São Leopoldo.
Pouco depois, fui procurado por alunos que organizavam uma chapa de oposição para o Grêmio Estudantil Tiradentes. Nosso candidato a presidente foi o Jairo Pafiadache de Quadros, e eu era seu vice. Anette Morelle, prima do Jairo, também estava na chapa.
Eles eram de uma família politizada de Quaraí, e participavam da construção da Juventude Socialista do PDT, dirigida por ex-militantes da VAR-Palmares. Nossos “assessores” – Manolo, irmão do Jairo, e Élgaro, irmão da Anette – falavam com admiração de Calino e Carlos Araújo (não me lembro de mencionarem Dilma, integrante do mesmo grupo).
Ganhamos as eleições facilmente, com uma campanha criativa. Henrique, meu amigo cabeludo, preencheu o nome da chapa (“Unificação”) com desenhos psicodélicos numa matriz de mimeógrafo a álcool (a técnica de propaganda de massas ao nosso alcance). Saltando o murinho do Fórum saíamos do colégio para ir a reuniões secretas, e por ali entrou o equipamento de som da banda Phoenix com o qual fizemos um “comício relâmpago” na hora do recreio.
Após quinze dias nossa gestão foi interrompida bruscamente pela Polícia do Exército, que apreendeu nossos documentos, cartazes e discos (de Geraldo Vandré a rock’n’roll) e lacrou a sede do grêmio.
Apesar da abertura, o medo permanecia onipresente. O professor Baldissera, numa reunião sigilosa, me explicou que os docentes solidários conosco temiam represálias. Meus pais foram ameaçados com a Lei de Segurança Nacional por causa de um texto “subversivo” de minha autoria. Dois colegas foram expulsos. Eu já tinha passado por média, mas ao tentar me matricular, no ano seguinte, descobri que não havia vagas para mim, decisão ratificada pelo delegado Regional de Ensino. O sistema público fechava suas portas a um aluno de desempenho exemplar, numa idade em que a Constituição o obrigava a permanecer estudando.
No Colégio São Luís, fui recebido de braços abertos pelo padre Roberto, amigo de Dom Pedro Casaldáliga. Acabei me tornando presidente do Grêmio Estudantil Edson Luís.

A primavera no Pedrinho foi curta, mas marcou minha vida para sempre.

Um comentário:

  1. Resgatar a história que os mesmos erros não se repitam. Parabéns, Alexandre, pelo brilhante texto. abraço
    Suzane

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